terça-feira, agosto 17, 2010

João das ruas do Rio







Quando o mestre sabe magistralmente inserir
Nos textos, regras de um jogo que já começou
E são regras conflitantes
Regras que exprimem desejos inconscientes
E passa as noites esperando pelos dias subsequentes


Na luz extravia-se da verdade e na treva encontra a aparência
Demência, arte e neurose sem reedições
Cativaste os hipócritas da “Belle Époque” carioca
E, se esgotou nas prateleiras
Permanentemente acusando sua glória e vertigem, às olheiras


Ambientes requintados são promíscuos?
Ou é só sua meticulosa e jornalística visão?
Internalizada e gerada nos escritos
Fostes um dândi provocador
Estudante de gestos coloridos e distintos


Elegantemente direcionando o foco para si
Trafegando nas veias urbanas dos bairros grã-finos
E nas calçadas fétidas dos becos mundanos
Insano opositor da família; frequentador de livrarias e cafés
Aplicador da ordem e do afeto superficial nos bordéis


Não faz mal, suas personagens sempre lhe escapam do domínio
Tornam-se maiores, perigosos, inescrupulosos, ardilosos e donos da noite
Só se revelam nas madrugadas, alusão às picadas
Noite e rua, luz do gás, luz da lua
Nos braços de Clotilde, pelo noivo, alfinetadas na carne crua


Cinismo que emana caos, vício, hermetismo e pavor
Anseio dos que abandonam as casas e buscam o acaso frenético
E são eles, os mesmos de sempre
Cada qual com seu final surpreendente
Alcoólatras, esquizofrênicos e sádicos
Vendedores de corpos, neuróticos, suicidas e prostitutas que habitam o covil
Aqui, nessas tuas linhas, não há espaço para a normalidade irritante
Desgastante prazer abundante que a artificialidade urbana lhe conferiu.




*João do Rio, pseudônimo de João Paulo Emílio Cristóvão dos Santos Coelho Barreto, carioca, nascido, em 5 de agosto de 1881 e falecido em 23 de junho de 1921, foi escritor, jornalista e teatrólogo.

Estima-se que cerca de 100 mil pessoas tenham comparecido ao seu funeral.

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