segunda-feira, abril 25, 2011

O estranho silêncio da senhorita Vogler



O que lhes contarei ocorreu nas frias e longínquas plagas suecas. Sou a enfermeira Alma e contar-lhes-ei tudo o que aconteceu. Trata-se da senhorita Vogler e ela ficou em silêncio por mais de um minuto naquele teatro. Um longo, longo minuto que deixo-nos atônitos, pois interrompeu seu belo ato

Repentinamente; ela parecia estar surpresa com esse fato. Como é possível ser uma só e outras tantas? Diante da platéia curiosa e atônita. Sorriu com a boca e se esquivou

Para trás da gélida cortina rubra, então... Viu-se nela um semblante infantil, um leve prazer. E um olhar maligno um tanto estranho, já sentada em seu camarim. Desde o início, sabia que nada poderíamos fazer

Por ela; o seu silêncio profundo e sua inanição. Foram tomados por sua própria decisão, ela possui enorme força mental . E está se testando, assimilando seus medos, provando da sua própria dor. Analisei-a por duas semanas pude chegar a essa constatação

Eis aqui os relatórios, doutor...






*Baseado em: Persona (1966)
Direção: Ingmar Bergman.

quinta-feira, abril 21, 2011

O envelhecido ator das madrugadas



Houve um tempo em que dormia tarde para vê-lo. Crescia um jovem nesse admirável velho mundo. Encantado com suas velhas criaturas imundas

Até que... Banido foi de minha presença. Arrancaram-nos um do outro sem maiores explicações

A sentença, Grade de horário, nova programação: “A emissora não se responsabiliza por eventuais alterações sem prévio aviso”. E a madrugada mais preta e branca ficou

Oh, querido velho artista, como vão as suas dores? Em qual companhia brilhará? Serás novamente protagonista? Qual será, na Hammer, o cast de novos atores?

Como está Sua Majestade?. Sente-se bem, meu Rei? Tirei-o do túmulo e, agora... És tão injusto comigo

Acaso, sente-se feliz? Por atar-me nessa poltrona fumegante? As lágrimas queimam o meu rosto. As chamas não...

... Queimam minhas melhores intenções. Preste atenção, eu disse: “Minhas melhores intenções”. Trouxeram-me o maior dos males terrenos

Irrompam-se agora, todo o ódio e o desprezo. Só assim, retiro-me de tua presença, antes. Fique mais um pouco, fique com as batidas do meu coração. Fique e ouça minha máxima oração

Fique e ouça os rugidos das gárgulas. E eles vêm do telhado gótico do teatro abandonado. Tolas estátuas de pedras e seus lodos verdes. Serão queimadas vivas, há fogo por todo lado

Se eu tivesse olhos para guiá-las. E língua para dirigi-las. Salva-las-ia; fingiria um novo ato. Que se chamaria: “A melancolia de Maria”

Eu sei quando se vive e quando se morre; basta cobrir com um lençol. O suposto corpo e, ficamos tão mortos quanto a Lua que brilha sobre a Terra. Entretanto, devemos admitir, sem exageros. Ela sabe muito bem como usar a luz do Sol.
















*A Vincent Price: 27/maio/1911 - 25/outubro/1993.

sexta-feira, abril 15, 2011

Sobre a Ponte Courson



Um táxi... Morrison Hotel. Nesse banco de trás. Couro e cheiro de gente. Lembrei-me de Orson Welles. Calor... Sob os meus pés


Rodo pela avenida iluminada. Atravesso a ponte Courson. Vejo aviões piscando, descerem. Subirem e vou... Construindo o meu passado. Em situações que deixaram de me pertencer


É melhor eu parar de narrar. E só observar... Os muros, as esquinas, as putas de negro. Lixos e cachorros, neons e coletivos. Batalhas épicas e cavalarias, eu me nego


Essa, outra, qualquer história. Afinal, toda história tem... Finais decadentes, têm. Na verdade, só conto o que vejo. E essa história eu vejo há tempos


Por que, o que ocorre, é que não ouço ninguém. Aliás, quem é você garota? De onde você vem? Tensos, vamos juntos pelo caminho suspenso. Sei que está perdida e não sabe o que fazer... É muito tarde e na neblina iremos desaparecer.




*A Pamela Susan Courson (22/12/1946 – 25/04/1974) eterna companheira de Jim Morrison.

*George Orson Welles foi diretor, co-roteirista, produtor e ator em Citizen Kane.

sábado, abril 09, 2011

Ao pintor das cores puras



Você entra atirando e faz as perguntas depois. Ao homem que roubou seus proventos e sua água fria. E você o ameaça com desdém... ... Finge botar fogo em seu armazém


Mas eles o pegaram no ato sarcástico. Enquanto cantava a fim de encerrar o fato. E, desde então, ouvimos o seu lamento trágico. Chafurdando a cara e se arrastando na lama da vergonha



Degas, faça novamente Dreyfus confessar-nos a traição. Estranho, somente os pés dele permanecem limpos. E, por eles, o carrasco o suspenderá do chão. Até que chegue a vez de outro terminar dentro do nó. Confessar-nos-á suas traições na cidade ou no campo de batalhas?




Foi ele quem fez as rodas que giram e giram, pararem de girar? Quando você soube que ele não foi nenhum notável escalador? Diga-nos Degas, ele é realmente o tal sabotador? Então, você acha um único amigo entre vários impressionistas?



No seu quarto, com seus pincéis e cavaletes a saborear seu Absinto.
A observar a “pequena bailarina de 14 anos”, “as bailarinas na barra”. E você está certo quando afirma-nos que o fim está próximo. Mais do que imagina; porque desdenha desse pequeno selvagem?


Tudo que ele traz só remete-nos a tristeza e seu bronzeado nos deixa desconcertados. Todo o tempo você sabia que ele estava sorrindo e de onde ele vinha... O sorriso da ignorância o fará cair de joelhos quando contarmos aos parisienses que ele é ameríndio. Agora você jura, blasfema, nos implora com cinismo



Que não é um homem desonesto jogando xadrez. Então você acha que não se casar é interessante? Degas, sua visão está tão comprometida, não obstante... ... Acredita que suas esculturas podem lhe trazer dinheiro? Assim você as mostrará quando for capaz e ir à Nova York em busca de aventuras, leite e mel. E você as colocará na mesa, expostas como um “nu na banheira”. Para que a vunerabilidade feminina nunca mais seja vista da mesma maneira.




*A Edgar Degas (19/07/1834 - 27/09/1917)
Pintor e escultor francês.

domingo, abril 03, 2011

Com o amor não se brinca






Você incendiou o meu mundo. Dizendo-me que poderia me tirar da solidão. Resgatar-me do fundo... Daquele poço; nunca havia conhecido uma pessoa assim. Tão decidida, tão carinhosa e tão cheia de intenções



Segundas tolas e rotineiras, tornava-as inesquecíveis para mim. Os ponteiros giravam e nós extraíamos o máximo um do outro. Tinha o controle da situação, dizia para mim mesma que não iria me apaixonar, apenas curtir suas provocações. Só iríamos jogar um jogo perverso com inúmeras concessões. Um jogo em que ambos entramos sabendo as regras e demo-nos liberdade às amplas movimentações



Além de conhecermos muito bem as possibilidades de jogadas, as permissões. Das peças; passei a sonhar com você e acho que isso também aconteceu contigo. Às pressas, sua face e gestos mudaram, os seus modos de cavalheiro se deturparam em performances teatrais. Não fui a culpada e nem foi culpa sua; contracenamos num roteiro feito pelo destino . E seu comportamento só encontrava a pulsão satisfatória...



... Quando introduzia objetos e falas inadequadas a conjuntura que eu permitia. Redescobri que, nesse mundo só há flertes e superficialidades, desatinos. Ninguém ama ninguém e não queríamos nos apaixonar. É a famosa situação “sobre controle” que o sentimento nos desafia... Faz questão de desafiar-nos dia após dia, nos dando migalhas afetivas e roubando nossa pouca alegria.


*Baseado em: “Wicked Game”, canção de Chris Isaak.