quinta-feira, outubro 20, 2011

O muro que respira (me sufoca)


“Minh’ alma
Que não pertence a essa sombra que tomba
Nunca mais será desenterrada”
(O corvo: Edgar Alan Poe)



Naquela noite, uma voz negra e doce sussurrou em meus ouvidos como asas de morcego
Imerso num sonho claustrofobicamente mudo e fechado
Não havia formas sensatas de comunicação
E, eu não podia indagar porque fizeram aquilo comigo


Fui emparedado, cimentado vivo
Assim como um tijolo fixado
Fixado fui nessa parede de concreto
Onde não há outro sinal orgânico de vida


Só há decadência e loucura nesse muro maldito
Que divide o espaço entre o dentro e o fora
Agora, que acabei de acordar (do sonho)
Poe se virou para mim, ele esteve o tempo todo ao meu lado


E sorrindo de lábios fechados não me dirigiu a palavra
Mas, eu entendi o que o mórbido poeta quis me mostrar
Arrancar-me-ão a alma da matéria, meu corpo terei que abandonar
Sem conseguir imaginar, descobri que meu sepultamento está a chegar


*A Tim Burton
*Baseado em "O barril de Amontillado" de Edgar Allan Poe.

sábado, outubro 15, 2011

Pesadelo na Terra dos Sonhos




Havia esperança e éramos muitos
Mas a incerteza e a insegurança vieram e pairaram no ar
Tínhamos as mentes sob uivos, assombros e terror
Dúvidas, muitas dúvidas, prece e louvor


Amenizavam, o fogo brilhava intensamente trazendo calor
Havíamos acabado de acendê-lo e nossos olhos brilhavam
Brilhavam de pavor e pudemos vê-lo
Ah, lembro-me quando o vimos se aproximar...


... Tinha braços enormes e a cabeça se destacava
Garras e dentes que nos intimidavam
Começamos a correr, correr o mais rápido que podíamos
E, aquele estranho ser, passou a nos seguir


Desde então, vivemos aflitos e inseguros por aqui
Nesse mesmo lugar que escolhemos com convicção
Era a "terra dos sonhos", afirmávamos aos irmãos
Hoje, vivemos acuados e temerosos, sem respostas, sem razão


Há alguns que duvidam e nos dizem:
Não acreditamos nisso, é tudo fruto da imaginação
E vocês são uns tolos por terem escolhido esse lugar de podridão
Mas, questionar o nosso sonho não está mais em questão



*A Lon Chaney Jr: The Wolf Man (1941).

segunda-feira, outubro 03, 2011

Lou Reed na sala de jantar




Estamos todos reunidos na sala de jantar
E, roemos as unhas uns dos outros
Já que, não há como roer as nossas próprias
Eu olho pela janela de vidro e só percebo construções utópicas


Parece ser muito fácil fugir desse lugar decadente
Mas, as últimas notícias vindas daquele velho jornal
Avisam-nos que, devemos permanecer trancados mantendo a calma
Afinal, não é bom sair por aí numa fria noite de natal


Estou cansado demais para pedir sua mão
Nela, percebo que não há mais unhas aptas ao rôo
Aqui, todos sonhavam com altos cargos de diretoria
Investidores da bolsa, exploradores de petróleo, comerciantes de especiarias...


... Hoje, só vemos o calçadão sujo repleto de cachorros imundos
Encharcados pela última chuva, hospedeiros de pulgas e carrapatos
A noite está límpida e podemos ver as estrelas, ouvir o barulho dos sapatos
Também ouvimos um concerto... Acho que vem do Teatro Central


As ruas trazem malícia e crianças vendem rosas de plástico nas esquinas com semáforos
Quando estão todos vermelhos, as prostitutas se aglomeram oferecendo seus serviços
Fico observando como selecionam seus clientes a dedo
De repente, achei a sorte, encontrei um livro dentro da lixeira


E, enquanto eu ter que permanecer aqui, lê-lo-ei 
Até que eu descubra realmente o que ele quer dizer 
Pois, não é sempre que se encontra um clássico na lixeira
Apoio-me na cadeira e começo pelo capítulo que terminei na última terça-feira



*A Lou Reed.
Nascido Lewis Allen Reed
(02/03/1942 - 27/10/2013).

sábado, outubro 01, 2011

O último mergulho do diretor



James, por favor!
Não se aproxime da água
Ela poderá te ferir
Devo interferir no seu banho de sol?


Volte, dê um passo atrás
Vou discordar de ti
O futuro não é só velhice, doença e dor...
Sei que gostas desse lugar


Precisas de paz, muita paz
E, há várias maneiras de obtê-la
Tente James, tente se libertar desse pensamento
A autodestruição não lhe cabe


Luzes e câmeras, ação no estúdio
Fizestes inesquecíveis obras-primas
E, ainda não é hora de sair de cena
No prelúdio, não usarei a palavra “louco”


O que essa menção causaria?
Petrificar-lhe-ia?
Seria melhor assim...


... Saia do sol e sente-se ao meu lado
Ao longe, vejamos as ondas
Sei que sempre gostou de trabalhar nas sombras.






*A James Whale
(22/07/1889  –  29/05/1957).