segunda-feira, dezembro 30, 2013

O construtor de pirâmides (Parte 2)



“You are young and life is long
And there is time to kill today
And then one day you find ten years have got behind you”
(Pink Floyd: Time)


Mr. Walters, por favor, atravesse o rio
... Nilo, sereno, tocando em compasso falho
E, me deixe propositadamente um vazio
Para que eu me complete, só assim perceberei...


... Acordes, tons, ruídos, colagens sonoras, crianças em uníssono
E a obra-prima será criada, gigantesca como uma pirâmide
Um álbum com uma música única, gerado e concebido...
... Construído a partir de várias micro-canções, um filme em P&B


Ligações conceituais, visão e audição, interagindo e se completando
Formando uma parede; tijolos e tijolos sobre reverberações
Vamos começar a sessão; prismas, um a um sobre...


... Pilhas de dinheiro; em tempo, um lunático “On the run”
Dorothy e seu cachorro; o “Mágico de Oz” ganhando cores
E o leão rugindo em sincronia com “The Dark Side of the Moon”



*Homenagem ao ex-lider do Pink Floyd, Roger Walters.
*”The dark side of the moon” (1973) é um álbum do Pink Floyd que, se sincronizado com o filme “O mágico de Oz” a partir do rugido do leão na vinheta de abertura da Metro-Goldwyn-Mayer Inc (MGM) torna-se uma trilha sonora paralela durante os primeiros 43 minutos do filme.


sexta-feira, novembro 01, 2013

A amante de Mellors



“(...) Numa delicada convulsão, o mais vivo do seu espasmo foi alcançado;
Ela o sentiu alcançado – e tudo se consumou:
Seu “eu” esvaiu-se; Constance não era mais Constance,
Apenas uma  mulher.”
(Trecho de “O Amante de Lady Chatterley”: Lawrence, David Herbert)


Tentando ficar de olho, como um cego magoado, vejo-te iluminada
Perdido nessa cama, sem perceber a dica do dia, paraplégico e inválido
Dizendo o que não devia a mim mesmo, recordando o passado saudável

E puxando assunto com as paredes, sou o barão Clifford Chatterley.


Considere isto, pecado e traição entre folhas da Bíblia...
Coladas até o teto; clamando a salvação, entrego-te querida
A guerra me deixou incapaz, marcou minha existência 

E o que aconteceria se você não tivesse realizado suas fantasias?


Se nunca tornassem realidade, se não conhecesse os prazeres da carne?
Eu sei que fui longe demais, Chatterley, mas você me incentivou...

Sempre via você sério, contando-me histórias sobre a guerra e seus feridos.


Achei que poderia ouvi-lo cantando, tentando voltar a andar
Pensei ter visto você tentar... Ouça-me, vou lhe falar, meu marido

Apaixonei-me por Mellors e, um filho dele eu estou a esperar!




*Baseado em 
O Amante de Lady Chatterley (1928)
D. H. Lawrence.

quinta-feira, outubro 17, 2013

A distância entre nossos olhos



“Os homens compram tudo pronto nas lojas...
Mas como não há lojas de amigos, os homens não têm amigos.”
(Antoine de Saint-Exupéry)


A vida é muito maior do que você e eu
Eu não sou você, não somos um do outro?
Os extremos que eu percorri são menores do que a distância entre nossos olhos
Sozinho, comigo mesmo, eu falei demais...

Puxei aquele assunto proibido, esse sou eu no canto
Aquele sou eu no centro das atenções, minhas atenções, redescobertas
Perdendo minha fé e encontrando-a em seguida; canto um Salmo
E tento me igualar a você, a mim mesmo, como uma fábula.

Não sei se consigo fazer as mesmas perguntas, num monólogo
Já me questionei demais, busquei respostas que não queria encontrar
Não me convenci o suficiente para me fazer rirnarrar um prólogo.


Antes, acho que pensei ter visto você tentando me explicar...
Por favor, desenha-me um carneiro¹, resgata minh’alma do celeiro
Perdoe minhas confissões, subamos nesse aeroplano e desse deserto iremos decolar.




1.”Por favor, desenha-me um carneiro”: Frase extraída do livro: O Pequeno Príncipe (1943)
*A Antoine-Jean-Baptiste-Marie-Roger Foscolombe de Saint-Exupéry (29/06/1900 – 31/07/1944).

domingo, outubro 13, 2013

Kri Demmall passando



Quem se lembra de uma nuvem?
(Guy de Maupassant)


Lá vem ele; pela janela posso ver...
... Kri Demmall passando, através das cortinas, passando
Com seu jeito despojado, torto, vago, sem chapéu
Trazendo consigo um valor finito que desvaloriza sua possuidora

Um trago; por ele, deixei minha casa, abandonei a velha cidade
Sou réu revel, vou a deriva, de terra em terra, ora vermelhas...
... Amarelas, estou diante de outra estrada; da face escorre-me sal
Eu, que sou um homem de família, acusado fui por Kri Demmall

Passando; sobre minha cabeça, urubus girando; grilos e cigarras em uníssono
Cantando acusam-me, dizendo que aquele favor, outrora favor de amigo
Tornou-se uma desgraça, uma aflição terrena, um torpe vício

Você ainda me considera um amigo?
Desde que o sol escureceu e a lua silenciou-se, clamo a Deus em suplícios...
Vivendo em quartos pagos, de joelhos; num eterno e incessante castigo.






*A Henri René Albert Guy de Maupassant (05/08/1850 - 06/07/1893) e seu amigo Gustave Flaubert (12/12/1821 – 08/05/1880).

quarta-feira, setembro 04, 2013

Medo de voar

 “A campainha da casa do comissário Walter Moeding toca...
                                 Declaro que, naquele dia, por volta das 12h15 
                                                Atirei em Werner Totges e o matei”
                           (“A honra perdida de Katharina Blum”, Heinrich Böll)




Paul Morel confessou todos os crimes...
... O delegado Fonseca acende um cigarro e respira fundo
Na capa do Bild, uma foto e parte da matéria que esclarece os fatos
Será levado à juri popular em alguns meses, pegará uns 40 anos, pensa...


... Numa cela fria do 14º, garfos de plástico, um velho colchão úmido
Não é como um lar, mas você sabe, será provisório, sem janela ou TV...
... Pouco melhor do que a penitenciária depois do julgamento
Quando o levaram embora, no camburão, Morel ria...


... E nos dizia: "Todos os filhos de Deus terão que morrer, tombar ao chão!"
Se eu sinto arrependimento pela morte de Erica Jong?    
Nenhuma delas, Katharina Blum, Ana Clara, Lorena e Lia!


Necessário, sem remorso, elas me feriram a honra, tive medo de voar, enfim...
... O poder das palavras, o desencadear dos fatos, plantões, manchetes de mortes e sumiços
Me tornei um serial killer e a mídia ainda precisa muito dos meus serviços!





*”O caso Morel” (1973) é um romance de Rubem Fonseca.
*”Medo de voar” (1973) é um romance de Erica Jong.
*Katharina Blum é personagem do romance “A honra perdida de Katharina Blum” (1974) do escritor Heinrich Böll.
*”Bild”, jornal alemão que perseguiu com uma campanha difamatória o escritor Heinrich Böll.
*Ana Clara, Lorena e Lia são personagens do livro “As meninas” (1973) de Lygia Fagundes Telles.

sábado, agosto 24, 2013

RETINAS QUEIMADAS: APERTE EJETAR E DÊ-ME A FITA



RETINAS QUEIMADAS: APERTE EJETAR E DÊ-ME A FITA
(Núbia Poison / Marciano James / Rasec Augusto / Nosfa#)

Imagens: MARCIO MEDEIROS.
Licença: CREATIVE COMMONS.

terça-feira, agosto 20, 2013

Hotel Mário Quintana


     “A todos vocês, que eu amei e que eu amo
                                         Ícones guardados num coração-caverna
                            Como quem num banquete ergue a taça e celebra
                                       Repleto de versos, levanto o meu crânio.”
                                                                   (Vladimir Maiakovski)



No Hotel Mário Quintana
As noites são silenciosas e leves
As madrugadas, negras e frescas
Antemanhã, visita dos passarinhos nas janelas


Não importa a geléia de amora 
Nem a torrada no café matinal
Deixei de beber leite ainda jovem
E nunca gostei de cereal


Deixem-me em paz!
Não preciso de serviço de quarto
Deixem tudo onde está, só assim é que me acho


Diacho! Já lhes falei sobre o tamanho do quarto¹...
... Pode ser minúsculo, só preciso de uma escrivaninha!
Eu caibo dentro de mim mesmo² e saio cedo, só volto à tardinha.



               *¹.².Diálogo entre Mário Quintana e Paulo Roberto Falcão.
                                      *Homenagem ao poeta morador de hotéis.

terça-feira, julho 02, 2013

Piano de blues


“Voulez-vous couchez avec moi ce soir?
Vous ne comprenez pas?
Ah, quelle dommage!”
(Alexandre Dumas Filho: A dama das camélias, 1848)




Um fogo, e ela cai por cima de si própria
Stella, esta canção vai para aquela que eu amo
Ah minha irmã... Ouça o piano de blues tocar
Dedico esta para aquela que eu abandonei...



... Uma estrela para ocupar meu tempo, me redimir

Me deixe olhar para você... Para eu me lembrar de Belle Reve
Mas aquilo foi apenas um sonho...
... Um sonho que Blanche DuBois insistiu em sonhar



Aqui, sou eu no centro das atenções nesse apartamento minúsculo!

Qual a sua ocupação, você vai se aboletar aqui com a gente?
Sou tão nova quanto a neve no alto das montanhas, Stanley
E dou aulas de Língua inglesa e Literatura em Laurel, estou em férias de verão


Lá também há fantasmas que povoam minha mente
Eles gemem, posso ouvi-los arrastando correntes, pesando o meu coração
Agora você está em New Orleans, ouça a polca ecoar
Perdi tudo minha irmã, perdi Belle Reve e não tenho aonde morar


Um piano toca... Longe, melancólico, ecoando pela cidade
Sensibilidade e brutalidade num mundo rude de sombras sinistras
Uma varsoviana distorcida faz emanar a loucura, ruídos da selva reverberam
Nesse bonde chamado desejo não há lugar para o refinamento que me deram.






*Baseado em “Um bonde chamado desejo” (1947), 
Tennessee Williams.

sábado, junho 15, 2013

Reduzido ao silêncio


  "Quando não há riscos na luta,
                                                               Não há glória no triunfo"
                                                       (Pierre Corneille: El Cid, 1637)




Amanhece, perdi-te atrás da máscara, e de novo
A amnésia me ajudou a te esquecer...
Mas, me lembro muito bem dele, tão selvagem e submisso ao homem
Chamava-se “Caninos Brancos¹” e vivia no Wild
Era o predileto de Jack London que, enquanto o acariciava, me dizia:
Olhando-me nos olhos, me dizia; todos os dias, mas eu não o encarava há tempos...
“Não desperdiçarei meus dias tentando prolongá-los”, era o que me dizia todos os dias...
Eu ouvia; por hora, usarei meu tempo... Tomamos um café, depois saio
Vou caminhando pela calçada e minha mente se oxigena

Lembro-me agora... Naquele dia, antes de bater a porta voltou-se para mim
Só então reparei... Vi tua face depois de muito tempo, criei coragem
Te olhei; não mudou nada, continua sendo quem tu era...
...Simplesmente o mesmo! Lembro-me de ouvir o teu cantar fenecendo... O mesmo
Lembro também de “O chamado da floresta²”, e adentro-me nele para viver as suas perguntas
Jamais matarei o melhor amigo de minh’ alma, o alcoolismo passa a não mais fazer sentido, caro Jack
Mesmo que o teu destino se torne imensamente funâmbulo, doloroso
O temor; e seu canto burlesco, desafinado, me tocaram...
... Nos ouvidos; só ele, é capaz de me elevar, só ele

Descubro o significado e perco a descoberta
Outra vez, logo em seguida por todos os dias
Também esqueço as batalhas, as derrotas...
E os triunfos e salvas eu esqueço
Quando o espetáculo termina, estarrecido fico!
Encerram-se o fascínio, as maravilhas pirotécnicas não me aturdem mais
E durante nosso jogo, nosso embate... Você mudou as regras...
Na sua vez, mudou as regras e movimentou a peça; fui derrotado...
Eliminado por quem me havia recebido com uma flâmula da vitória

De honras e glórias, marcas de conquistas que nunca vi...
... Povos que, quando cheguei não estavam mais aqui
Desde então, adentrei-me ao profundo “Eu” e descobri que, num denso silêncio fui concebido
Nunca me houve suavidade nessa vida; a onicofagia me acometeu desde cedo, preterido...
... Nesse inconstante mundo rumoroso, vago afoito, feito um cão
Onicófago que só olha para as próprias unhas e late...
Ladro e o latido ecoa na escuridão... Estou olhando para elas, minhas unhas
Elas estão gastas, estão aparadas e sujas; são minhas garras e são tão minhas...
Assim como... As de Prometheu³ que, também sujas e curtas, só dele são!



¹Caninos Brancos (1906) e ²O chamado da floresta (1903) são livros que narram as aventuras de cães e lobos no Wild Ártico.
Foram escritos por Jack London (1876 – 1916) um escritor prolífico e vibrante, mas que sucumbiu diante do alcoolismo deixando-nos um legado de grandes aventuras e ficções arrebatadoras.
³Prometheu: Do grego, Prometeu. Na mitologia, tentou ajudar os humanos, dando-lhes o fogo.

quinta-feira, maio 09, 2013

O construtor de pirâmides




“The time to hesitate is through
No time to wallow in the mire
Try now we can only lose
And our love become a funeral pyre”
(Light my Fire: Robby Krieger, The Doors)



De que me vale construir pirâmides?
Se vago a esmo nessas terras áridas...
... Nessas terras áridas e inóspitas!
As mesmas terras em que o jovem faraó foi enterrado
Mumificado, idolatrado e, pelos seus súditos, consagrado

Aqui, só o leito do rio contém os nutrientes
E são necessários todos os esforços para preservar sua lápide
Extremamente necessário também é espalhar suas sementes
Para permitir a evolução de espécies raras...
... E em ritmo rápido curar os pobres doentes

Às margens do Sena, difícil é, dizimar pestes
Dormi num sonho e vivo um pesadelo no Oriente
Olho para o alto, em meio à tempestade de areia
Não há nada que me oriente... Nada!
Não há corpos celestes e nem estrelas cadentes

Nada, brevemente, porém... Sinto uma esperança, nada mais
Sou um navio sem cais, mas, em meio ao caos, volto a nascer
Dentro dessa banheira, sinto o amor novamente crescer
E, em Père-Lanchaise declaro que os amo...
... Amo todos os meus amigos, amo-os!Père-Lanchaise

Os que vieram, os que se foram e os que erraram comigo
Festejaremos a saída daqui?
Está tão apertado, tocar-nos-ão os órgãos?
Brancos e negros, juntos, como peças de um piano...
... Escaparemos de mais essa cilada?
Cilada, essa, que nós mesmos planejamos.



*A Ray Manzerek, John Densmore e Robbie Krieger.
*Père-Lanchaise 
Cemitério de Paris onde está enterrado o corpo de 
James Douglas Morrison (1943 - 1971).

sábado, abril 27, 2013

Medo de voar




“A campainha da casa do comissário Walter Moeding toca...
Declaro que, naquele dia, por volta das 12h15
Atirei em Werner Totges e o matei”
(“A honra perdida de Katharina Blum”, Heinrich Böll)


Paul Morel confessou todos os crimes...
... O delegado Fonseca acende um cigarro e respira fundo
Na capa do Bild, uma foto e parte da matéria que esclarece os fatos
Será levado à juri popular em alguns meses, pegará uns 40 anos, pensa...

... Numa cela fria do 14º, garfos de plástico, um velho colchão úmido
Não é como um lar, mas você sabe, será provisório, sem janela ou TV...
... Pouco melhor do que a penitenciária depois do julgamento
Quando o levaram embora, no camburão, Morel ria...

... E nos dizia: "Todos os filhos de Deus terão que morrer, tombar ao chão!"
Se eu sinto arrependimento pela morte de Erica Jong?   
Nenhuma delas, Katharina Blum, Ana Clara, Lorena e Lia!

Necessário, sem remorso, elas me feriram a honra, tive medo de voar, enfim...
... O poder das palavras, o desencadear dos fatos, plantões, manchetes de mortes e sumiços
Me tornei um serial killer e a mídia ainda precisa muito dos meus serviços!



*”O caso Morel” (1973) é um romance de Rubem Fonseca.
*”Medo de voar” (1973) é um romance de Erica Jong.
*Katharina Blum é personagem do romance “A honra perdida de Katharina Blum” (1974) do escritor Heinrich Böll.
*”Bild”, jornal alemão que perseguiu com uma campanha difamatória o escritor Heinrich Böll.
*Ana Clara, Lorena e Lia são personagens do livro “As meninas” (1973) de Lygia Fagundes Telles.

sexta-feira, março 01, 2013

Estação Maiakóvski




“Escritores há muitos. Juntem um milhar.
E ergamos em Nice um asilo para os críticos.
Vocês pensam que é mole viver a enxaguar
A nossa roupa branca nos artigos?”
(Vladimir Maiakóvski)




Os limpadores fizeram o trabalho, entre e sente-se, senhor
Obrigado, eles recebem para isso e é o que fazem de melhor?
Como você se sente, meu caro escritor?
Saiba que a inspeção do seu trabalho será semanal, acostume-se!


Eles estão se alinhando para revistar-lhe a bagagem
De mão, pobre do velho James, está branco como um fantasma
Ele não encontrou a resposta perdida nas entrelinhas que escreveu...
... Lamuriamos agora, prevaricaram sua arte, corromperam sua poesia


Não há nada que possamos fazer para resgatar sua obra?
O vagão “Oito” vai lotado da 30ª Edição destruída pelas traças
Estamos todos a bordo desse trem misterioso...
... Que vai para o reino dos escritores que ninguém leu


Fiquei apreensivo e preciso de algo para beber
Enquanto o trem, nem ao menos deixou a estação
Agora percebo o quanto fui tolo...
... Você reservou um assento ao seu lado


E eu fui me sentar na janela da imaginação
Me sentia aprisionado pela escrita, mas agora estou livre
Estou lá, pendurado na paisagem, consegue me ver?
Na hora da partida, entrego o bilhete e, ninguém irá me deter!


Quem fica, quem sai, quem senta, estamos a bordo, observando quem nele entra
No trem que vai para o reino dos escritores que ninguém leu
Outro apito, fiquei apreensivo e preciso de algo para beber


Você reservou um assento ao seu lado
E eu fui me sentar na janela da imaginação
Enquanto o trem, nem ao menos deixou a estação...









*A Vladimir Maiakóvski (1893 – 1930)

sexta-feira, fevereiro 22, 2013

Um fotógrafo na França ocupada



"Fotografar é colocar na mesma linha de mira
A cabeça, o olho e o coração".
(Henry Cartier-Bresson)


Não dá para acreditar que vagamos por essa França arrasada
E ninguém nos convida para beber e nem comer nada
Estou faminta e você só quer tirar fotografias!
Como poderei sorrir, estando com tanta fome?


Há dias, erramos por essas estradas frias
Minha Leica captura paisagens e pessoas, não seus pensamentos, querida
Não tenho compreensão do que estamos fazendo, Henri!
É melhor nos apressarmos, vamos sair logo daqui...


... Estou com fome, Henri, vou lhe repetir
Quero bolo, café e um suco gelado
Pois, a sede também me desafia


Tive uma ideia, paramos numa cafeteria...
... Lavamos o rosto, as mãos e nos sentamos lado a lado
Eu peço um café com torradas e você o jornal do dia.



*A Henri Cartier-Bresson (22/08/1908 – 03/08/2004).

sábado, janeiro 05, 2013

A insônia da Morte




“Aqui vejo coisas que a mente humana jamais viu
Aqui sofro frio que o corpo humano jamais sentiu
É este o misterioso reino dos ciprestes”
(Vinícius de Moraes)



Não havia comiseração ou piedade
Atrás da máscara, não havia
Face, às cinco e meia...
... Madrugada, lua cheia que tardia


No horizonte, dormem crianças, lábios abertos
Olhos fechados, Vinícius também dorme
Corpos inertes, vestidos de branco
Enquanto dormem, só os pescadores


Acordaram cedo, tarde da noite
Tão tarde, o medo da morte, cedo
Ela, paciente, espia o mar


É a hora de lançar as redes
Rumar os barcos ao infinito e navegar
Ao profundo e misterioso reino das águas verdes.



*Baseado em “O cemitério na madrugada” de Vinícius de Moraes.