"Quando não há riscos na
luta,
Não há glória no triunfo"
(Pierre Corneille: El Cid, 1637)
Amanhece, perdi-te atrás da máscara, e de novo
A amnésia me ajudou a te esquecer...
Mas, me lembro muito bem dele, tão selvagem e submisso ao homem
Chamava-se “Caninos Brancos¹” e vivia no Wild
Era o predileto de Jack London que, enquanto o acariciava, me dizia:
Olhando-me nos olhos, me dizia; todos os dias, mas eu não o encarava há
tempos...
“Não desperdiçarei meus dias tentando prolongá-los”, era o que me dizia
todos os dias...
Eu ouvia; por hora, usarei meu tempo... Tomamos um café, depois saio
Vou caminhando pela calçada e minha mente se oxigena
Lembro-me agora... Naquele dia, antes de bater a porta voltou-se para
mim
Só então reparei... Vi tua face depois de muito tempo, criei coragem
Te olhei; não mudou nada, continua sendo quem tu era...
...Simplesmente o mesmo! Lembro-me de ouvir o teu cantar fenecendo... O
mesmo
Lembro também de “O chamado da floresta²”, e adentro-me nele para viver
as suas perguntas
Jamais matarei o melhor amigo de minh’ alma, o alcoolismo passa a não
mais fazer sentido, caro Jack
Mesmo que o teu destino se torne imensamente funâmbulo, doloroso
O temor; e seu canto burlesco, desafinado, me tocaram...
... Nos ouvidos; só ele, é capaz de me elevar, só ele
Descubro o significado e perco a descoberta
Outra vez, logo em seguida por todos os dias
Também esqueço as batalhas, as derrotas...
E os triunfos e salvas eu esqueço
Quando o espetáculo termina, estarrecido fico!
Encerram-se o fascínio, as maravilhas pirotécnicas não me aturdem mais
E durante nosso jogo, nosso embate... Você mudou as regras...
Na sua vez, mudou as regras e movimentou a peça; fui derrotado...
Eliminado por quem me havia recebido com uma flâmula da vitória
De honras e glórias, marcas de conquistas que nunca vi...
... Povos que, quando cheguei não estavam mais aqui
Desde então, adentrei-me ao profundo “Eu” e descobri que, num denso
silêncio fui concebido
Nunca me houve suavidade nessa vida; a onicofagia me acometeu desde cedo,
preterido...
... Nesse inconstante mundo rumoroso, vago afoito, feito um cão
Onicófago que só olha para as próprias unhas e late...
Ladro e o latido ecoa na escuridão... Estou olhando para elas, minhas
unhas
Elas estão gastas, estão aparadas e sujas; são minhas garras e são tão
minhas...
Assim como... As de Prometheu³ que, também sujas e curtas, só dele são!
¹Caninos Brancos (1906) e ²O chamado da
floresta (1903) são livros que narram as aventuras de cães e lobos no Wild
Ártico.
Foram escritos por Jack London (1876 – 1916)
um escritor prolífico e vibrante, mas que sucumbiu diante do alcoolismo
deixando-nos um legado de grandes aventuras e ficções arrebatadoras.
³Prometheu: Do grego, Prometeu. Na mitologia, tentou ajudar os humanos, dando-lhes o fogo.