sábado, junho 18, 2011

A pureza é um mito




Guardo essas fotos há tanto tempo
Que consigo sentir o seu calor presente nelas
Essas imagens são tudo o que possuo de ti, agora
Nós dois rindo, brincando, nos divertindo...


Ah, como era lindo o seu sorriso, o seu cabelo dourado
Quando a chuva caía e o céu desmoronava
Você voltava...
... Voltava para o meu lado em busca de conforto


Tirava-lhe o medo do seu semblante
E a mim, se entregava, como uma amante
Eu sempre me mantinha perto dos seus medos
Doravante, você declinava em meus braços e gemia baixinho


Mas, o medo se irrompeu do seu caminho
Finalmente, encontrou a coragem para enfrentar a vida
Sozinha...
Não mais se sentiu perdida no escuro


Entre lembranças e fotos, eu murmuro
Pensando em você, como costumava ser nossos encontros
Logo cedo, lentamente, percebo uma lágrima cair
Agora, sou eu quem vivo sob o jugo do medo


Escapaste de mim em silêncio
Estás nos braços dos anjos que domaram suas quimeras
Depois que dominaste o pavor, só vive de ilusões e pureza
Lembro-me de Oiticica que nos disse:
“A pureza é um mito”
Então, abro meus olhos, olho para o céu e te procuro no infinito.





*Hélio Oiticica (1937 – 1980), foi escultor e artista performático.
Ele é considerado o pai do Tropicalismo.

domingo, junho 12, 2011

A namorada de Paul Revere





"No, but not with kicks
You just need help, girl."
(Paul Revere and the Raiders)






Porque você tem tanta necessidade?
Necessidade de saber como vou passando...
Se estou bem e até mesmo o que estou pensando


Seja sincero...
Você quer mesmo saber?
O que move meu ímpeto
Como domo minh’ alma
Sou um animal acuado e pressinto


Às vezes perco a razão e convenhamos...
... Isso é tão normal
Tenho a necessidade de tentar me controlar
Fazer parte do “real”, afinal...
Sou mamífera com polegar opositor


Totalmente racional, tenho fome e uma arma
Fome e sede; dê-me vinho
Mostre-me o esconderijo da sua dor
Assim, quebraremos algumas regras ao longo do caminho
E aquelas taças do início do século também


Com um leve brinde quebrá-las-emos; tudo bem...
São do início do Século XXI, chinesas
Em qualquer hipermercado encontraremos outras
Em promoção, idênticas, como nossas almas são
E, as reporemos em nosso armário sem nenhuma consternação.


*A Paul Revere and the Raiders, banda de rock norte-americana.

sábado, junho 11, 2011

Quando eu morrer (Nasci na época errada)



“Não confio em músicas
Que não suspiram.”
(Nick Cave)


Quando eu morrer o libertino sorrirá
E, se regozijará, vendo-me sucumbir
Repetidas vezes, amiúde
Feliz, sua taça levantará
E brindará sozinho...
Saúde!


Viajei pelo mundo e só encontrei corações fechados
Nesse pesadelo delicado parei para contar minhas bênçãos
E, só me lembrei de uma
Foi quando meus gritos intensos fizeram você me ouvir
Você se virou e me disse:
Acho que nasci na época errada, baby


Na época errada eu nasci
Nasci na época errada, baby


E quando eu morrer o patife sorrirá
Regozijar-se-á, vendo-me sucumbir
Repetidas vezes, amiúde
Feliz, sua taça levantará
E brindará sozinho...
Saúde!




*A Nick Cave, cantor australiano.

terça-feira, junho 07, 2011

Duas distantes


“Não há nada de mais em ser comercial.”
(Bryan Ferry)


Guarde tudo o que usa no cabelo, Lady Bitter-Sweet
Mais do que eu, um dia precisará de grana
O seu jeito de posar não agrada a mais ninguém
Veja, não há fotógrafos nem jornalistas por perto


Tentou blefar no jogo da vida com suas estórias mórbidas
Esse tipo de comportamento sempre me causou um sentimento de dó e piedade
Mas, nessa cidade, as coisas já não são como antes
Não compraram, por muito tempo, suas idéias vencidas


Desde então, a biografia está interrompida
Modificaram a capa, tire os olhos do papel e mire adiante... Na esquina
Há meninas, há traficantes, comerciantes
De especiarias, biltres, poetas decadentes e meliantes


Você bem que podia...
Entrar naquele quarto e arrumar pelo menos a sua cama; desde criança...
... A maneira com que caminha deixa o paraíso cada vez mais distante, de Berlim se afastaste
De mim, afastei-me de ti... Distantes, tão, nós...


... Estávamos muito perto de um acordo
E agora, tenho que encontrar um padre para me confessar de novo
É melhor fingir que nada mais vai mudar
Para melhor, tentar?


Para que tentar lucrar com o que já está falido?
Estou fadado ao encontro com sua lâmina fria
É melhor apunhalar de vez o meu pescoço
Fazer-me sentir um gosto ocre doce de sangue na garganta


Finjo ser capaz de jogar seu jogo ilógico e insensato só para ser apunhalado
Estou cansado, vamos acabar com isso!
Por muito tempo, só pude descobrir as regras durante a partida
E ouvia... Ouvia uma sirene... Que aumentava, ensurdecia!
Enquanto o gosto ocre doce saciava-me e me vencia.





*A Constanze Karoli e Eveline Grunwald
as alemãs fãs do Roxy Music que posaram para a capa do álbum:
Country Life (1974).


quarta-feira, junho 01, 2011

Eterna noiva de Prometheu


“O Castelo começou a desmoronar
Adeus, criatura, adeus
Dr. Pretorious não poderá lhe ajudar”
(R.I.P. 1935 – 1935)


Até onde posso chegar?
Preciso lhe dizer algo muito importante...
Sua imagem está gravada em minha mente
Tão soturna, tão branca, tão convincente e desolada

Definitivamente gravada
O estereótipo da garota gótica perfeita
Perco os sentidos diante de ti, Valerie Hobson
Acenda as velas, apague a luz, preciso lhe tocar

Delicadamente costurada à mão, envolta em brancos tecidos
Descanse em paz eterna noiva de Prometheu
Jamais me esquecerei de sua expressão facial
Vamos iniciar a sessão...
De cinema, em 1935 uma continuação da Universal.



*A Valerie Hobson 
(14/04/1917 – 13/11/1998).