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sexta-feira, dezembro 17, 2010

Já não somos mais os mesmos





Nós queremos carne
Desejamos muito comer a carne
De um porco ou talvez um suculento e enorme peixe
Mas, agora devo continuar...
Deixar que a loucura retorne de fato
Retorne e me faça querer matar
Nunca pensei que poderia concretizar esse ato
E, agora tenho certeza que posso fazê-lo



Nós queremos carne
Desejamos muito comer a carne
Uns dos outros?
Talvez?
Por que não?
Eles são malucos e temem as cobras desta ilha
Nem sei se há cobras nessa ilha, conheço só a esquizofrenia
Mas, sei que precisamos de abrigos firmes para nos proteger ao fim do dia



Nós queremos carne
Desejamos muito comer a carne
O Sol está se pondo e não temos muito tempo
Terei, eu, tempo?
Eis que me vem à idéia:
“Nessa ilha deserta, tenho todo o tempo do mundo”
Ninguém nos achará... Pobre de mim
Pobres crianças, enfim... Estamos imundos!



Nós queremos carne
Desejamos muito comer a carne
Andamos todos juntos, criamos um novo mundo
Um mundo de experiências empíricas e sentido abstrato
Sentido abstrato de sobrevivência de quem viveu apenas uma década
Agora, precisamos pegar um porco
Precisamos construir um abrigo
Precisamos dominar o fogo



Nós queremos carne
Desejamos muito comer a carne
Pegar os frutos no alto, onde “os menores” não conseguem alcançar
Descobrir os maduros, por entre as folhagens
Entregá-los àquelas mãos outrora sensíveis e delicadas
Sujas, unhas quebradas, arranhadas nessa nova realidade
Depois que o avião caiu, tudo em nossas vidas novéis se transformou
Da noite para o dia, já não somos mais os mesmos nessa nova comunidade



Nós queremos carne
Desejamos muito comer a carne
Entre trepadeiras e arbustos escorrem o nosso suor
Ouço as ondas quebrando, sinto um cheiro de jasmim
E um silêncio de sobrevivência que me incomoda tanto
Tanto quanto a irresponsabilidade dos que só querem brincar
Brincar na “piscina”, brincar no “jardim”
Espalhar-nos-emos pela ilha, em busca de que?



Nós queremos carne
Desejamos muito comer a carne
Ainda não nos ajustamos ao novo ritmo
Sentimos falta do café da manhã, do almoço, do chá, dos bolinhos
Faz-me mais falta as refeições do que a mão de minha tia e o que ela me ensina
Obedecemos ao som da concha e nos alinhamos pronto às ordens!
Ela é o nosso elo com o mundo adulto da autoridade e da disciplina
Acho que ainda não tenho maturidade suficiente para entender isso



Nós queremos carne
Desejamos muito comer a carne
Vamos ajoelhar na areia e ficar em paz
Parar de brincar e ficar olhando para o mar
Será que, em breve, um navio virá nos resgatar?
Nesse azul que machuca os olhos, os raios solares são como flechas
E os tabus, são como moscas
Moscas que rodeiam uma civilização em ruínas



Nós queremos carne
Desejamos muito comer a carne
Desejamos a proteção dos pais, a proteção do policial fardado
Todos nós estamos despidos, envoltos em pequenos farrapos
Arranhados, doloridos, desidratados, enquanto as pedras rolam
Enquanto a chama apaga, enquanto o medo aumenta, nós a míngua
Aqui, as coisas querem se parecer outras
Como um camaleão num tronco, preparando, ao ataque, sua língua



Nós queremos carne
Desejamos muito comer a carne
Faremos um relógio de sol!
Que ótima idéia!
Ótima idéia para nada
Devemos fazer coisas para que nos encontrem
Calem-se, calem-se todos!
Vocês deixaram a maldita fogueira apagar!



Nós queremos carne
Desejamos muito comer a carne
Matamos um porco
Rastejamos... Fizemos um círculo...
Acertamos e caímos em cima
Enquanto, Jack nos orientava:
Matem o porco...
... Cortem-lhe a garganta e lhe tirem o sangue!



Nós queremos carne
Desejamos muito comer a carne
Calem-se, calem-se e comam o porco
Que eu mesmo matei e preparei
Como o cheiro das flores, no crepúsculo, se espalha ao redor
Vamos fazer uma reunião, nos preparar para o pior
Vocês deixaram a fogueira apagar... Dizia-nos Ralph
Enquanto eu pintava meu rosto e visualizava, ao longe, um suposto navio



Vocês querem a carne
Desejam muito comer a carne
Em democracia o líder foi escolhido, ouçam-no tocar a concha
Mas, o fascismo impõe o medo e quer nos controlar
Façam o que ele manda, é melhor estarmos ao seu lado
Há uma revelação mística: “O mal está em nossos corações”
Não conhecemos a serpente, mas a tememos
Tememos, pois, temos razão e habilidade para vê-la com clareza



Vocês querem a carne
Desejam muito comer a carne
Descer a montanha fugir do fogo, se alimentar
Dê-me sua lente, Porquinho, são convexas e o fogo irá propagar
Já não há mais amarras que nos ligam à civilização
Quando a vara penetrar em suas entranhas, não grite!
Não grite, pois ele vai voltar
Sim, o Senhor das moscas não tardará a chegar.



*Baseado em: "O Senhor das moscas" (1954).
de Willian Golding (19/09/1911 - 19/06/1993).

sábado, junho 06, 2009

Indagações de Lou James, o Moderno Prometheu



Acaso, óh criador,

Lhe pedi que do barro me moldasse homem?
Pedi para que me erguesse das trevas?
(Willian Golding)


O que sou, agora que me fizeste?
Qual o ânimo que sentes em transformar matéria em vida?
Lembra-te quando esquartejavas o animal vivo?
Para resgatar-lhe o sopro de vida que perdias?

Hoje sou mais que homem!
Sou rijo como a rocha, sólido como o minério.
Uma substância consistente molda meu coração...
E não é a mesma substância fria das geleiras do Norte.

A sombra sempre será negra?
E, na busca da incandescência, acenderei minha pira funerária em triunfo...
E exultarei a agonia das chamas que meu corpo produzirá.
E, finalmente, minhas cinzas serão varridas pelo vento em direção ao mar.

Adeus...
Ad calendas greccas.

*Baseado na obra: "Paraíso perdido, Ato X", 
de John Milton(09/12/1608 - 08/11/1674).

quarta-feira, junho 03, 2009

Quase erro (ode a Mary Shelley) - Retinas Queimadas





Aquela menina nasceu
Filha de Golding se concebeu
Sua mãe do parto floresceu
E com Shelley se irrompeu.


O pai, resignado foi-se então
O padrasto o sobrenome deu-a senão
Sua mãe a iniciou na escrita
E na juventude se fez mulher aflita.


No castelo de Byron as férias passou
E, num lampejo a estória criou
Um terror fantástico
Que pelo mundo se consumou.


A obra, ao pai dedicou
Mas o sobrenome do padrasto herdou
Escrevia desde a infância, a ficção
Viveu no campo com forte obsessão.


Criar um conto, criar uma estória
Num quase erro, numa memória
Lembrou de fantasmas, lembrou do inicio
E na voraz escrita, uma obra no solstício.


A noite era sombria, lúgubre, mortal
Do sonho acordado, uma febre fatal
Desejou a criação feita com afeição
Que lhes tragam dor, dor e perdição.


O monstro sem nome
Herdou o seu do criador
Nesse quase erro
Todo mundo é entendedor.


Mary Shelley, saia do castelo
Mary Shelley, volte para casa
Nem Hamlet, nem Otelo
Fazem sombra à tuas asas.


O monstro sem nome
Herdou o seu do criador
Nesse quase erro
Todo mundo é entendedor.
Mary Shelley, saia do castelo
Mary Shelley, volte para casa
Nem Hamlet, nem Otelo
Fazem sombra à tuas asas.

"Ela plantara as sementes que tinha nas mãos. Não outras, só essas" 
(Clarice Lispector)

*Homenagem a Mary Shelley, escritora do romance gótico 
"Frankenstein" (1831).

Acesse RETINAS QUEIMADAS em: Canal no Youtube