sexta-feira, novembro 19, 2010

Sem você, houve mudança no sentido da arte





O que seriam?
Sem você, de que valeriam?
As lendas, doutrinas, os mitos e os vinhos
Filosofias e políticas, os muros e vizinhos


O que seriam dos versos?
E as batalhas épicas, o que seriam?
Os poetas e trovadores, o que diriam?
De que valem registros e estatísticas?


O que seria da Renascença?
O Expressionismo, o que seria?
O Cubismo não faz mais sentido
Por tua ausência, sinto-me preenchido


No Impressionismo não encontrei explicação
Como um auto-retrato que respira
Nem Van Gogh e nem Monet me inspiram
A sensação de perda deturpa todo fascínio que sentia


Os poemas são rascunhos e as orações estão a vagar
Trazendo a tona desilusão no olhar
Você partiu, tomou a decisão, tentei refutar
Exigiu o meu consentimento, a separação, não pude contraditar

domingo, novembro 14, 2010

Despida, atrás do volante



Embriagado, enfim...
... Lhe encontrei, garotinha!
E antes que a chuva caia serás minha
Façamos, então, o que havíamos combinado



Essa noite, você dirige e eu vou ao lado
Estamos nas mãos do destino e
Numa bandeja, entrego-me a ti, como um prato refinado
Você está atrás do volante e não me importo de ser saboreado



Despida sobre o banco de couro, conduz ao volante o meu veículo
Somos almas inconstantes, desapareceremos juntos através da chuva fria
Nessa metrópole só usufruímos o descobrimento de novos temperos
Respiramos o ar necessário, transformamo-nos em vultos dia-a-dia



Pelo pára-brisa percebo-a chorando, enquanto batem os insetos
Durante o trajeto, titubeia, há muitas dúvidas em suas manobras
Privilégio de tê-la deixado conduzir-me após a troca de insultos
E, ao seu lado o tempo todo, acompanho extasiado e perplexo o seu triste e desbotado reflexo. 




*Baseado em “Behind the Whell” e “Stripped” canções 
do Depeche Mode.

terça-feira, novembro 09, 2010

Reduzir ao silêncio


"Quando não há riscos na luta,
                                                               Não há glória no triunfo"
                                                       (Pierre Corneille: El Cid, 1637)
  




Perdi-te atrás da máscara
A amnésia me ajudou a te esquecer
Apesar de continuar sendo quem tu és
No crepúsculo vespertino lembro-me do teu cantar fenecer


Jamais matarei a melhor amiga de minh’ alma
Mesmo que meu destino se torne imensamente funâmbulo
O temor e seu canto burlesco, desafinado
Só ele, é capaz de me elevar, só ele


Descubro o significado e perco a descoberta
Logo em seguida por todos os dias
Também esqueço as batalhas, as derrotas
E os triunfos e salvas eu esqueço


Quando o espetáculo termina, estarrecido
Encerram-se o fascínio e as maravilhas pirotécnicas
E pelas regras do nosso jogo desconhecido
Fui eliminado por quem me havia recebido


Desde então, adentro-me ao profundo “Eu”
E percebo, na presença do silêncio, fui concebido
Já não há suavidade, a onicofagia me acometeu


No inconstante mundo rumoroso
Minhas unhas estão curtas e sujas
Como as de Prometheu.

sexta-feira, novembro 05, 2010

A garota lagarta






Aí está você...
... Enchendo meu coração de esperança
Rastejando pelo chão, subindo paredes feito criança
Apareceu na minha frente, posso sentir sua fragrância



Me tente e
Tente de novo, tenha perseverança
Veja com sou insistente, mas
Se algum dia eu parar...
Farei questão de não restar nenhuma lembrança



Seu pó facial rosa e as mentiras bobas
Deixaram nosso relacionamento muito tolo
Se, eu deixar de curar suas feridas
Fará seu casulo, criará asas e ficará linda?
Fugirá para bem longe de mim com suas asas coloridas?



Por insistência, você se transformará?
Deixará de ser a garota lagarta...
... Que brilhava em minha mente?
Aquele verde cintilante que só os répteis possuem
Mostre-me sua língua, dê-me um beijo
Quem sabe, dar-me-á sorte efêmera?



Por dias, perdido na floresta, permaneci
Ouvia sua voz envolvente e, por ela me guiava
Um chamado profundo e, na escuridão, observava-me
Buscava encontrar seu casulo por entre árvores frias como tu
Obscura procura e a garota lagarta nunca esteve lá e nem vai estar
Enquanto isso, vou correndo para o nada como pode constatar.


*a Robert Smith, do The Cure.

terça-feira, novembro 02, 2010

O marinheiro no caixão



“Tão verdadeiro e sem sentido nenhum.”
(Fernando Pessoa)




É tarde demais para cantar reminiscências e contemplar os sonhos
Resta-me debruçar sobre a vida morta que trago comigo
Ah, pobre de mim que fui tão feliz outrora...
... Agora, vago nas sombras a embevecer ausências




Enquanto o horizonte se faz negro
A vida me espreita e já não sei em que pensar
Devo aquietar minhas ansiedades que já não são tão verdadeiras?
Daí, percebo uma réstia que se move insistindo em brilhar minhas mãos




O saber é demasiado impreciso para quem o esqueceu
No tempo que aqui fiquei a narrar-lhe meu sonho
A madrugada ganhou cor e se empalideceu
Mas o dia nunca raia para quem contempla o absurdo das horas




Que me importa o dia?






*a Fernando Pessoa 
(13/06/1888 - 30/11/1935).

segunda-feira, novembro 01, 2010

Massa encefálica (Delirium tremes)



“Ele está dormindo, mas, 
se falar sua língua, poderá acordá-lo”






Os tempos estão difíceis
Procuro novas fórmulas, indícios
De entreter-me a contento
Não deixando-lhe meus resquícios




Maus, diversão econômica, complemento
A qualquer instante, de...
Tentarei dormir agora, se
Tiver pesadelos, cólicas, eh




Vários deles
Girando em órbita
Tonteia-me
Antes de te...






... Comerei grandes lagostas e arroz
Feijão preto, leite e bicarbonato depois
Na cabeceira, a espera de
Um conto de terror de Lovecraft, que






Quando trouxer a sensação, me
Tal qual a ansiedade produz
Ouvirei o aumento da pulsação
De olhos fechados, apagarei a luz






E, no escuro, abri-los-ei
Mas, a claridade das ruas perturba-me
Inquieto, fico aguardando a visita da febre
Cabe a ela, orvalhar o colchão, vê






Midiática, ela desce ao porão
Confere as trancas, apaga as velas
Descobre o fantasma, um espectro que se revelou
E não se importa que tudo se acabe justamente onde começou.




*A H.P. Lovecraft
(20/08/1890 - 15/03/1937).